domingo, 17 de abril de 2011

Trecho: Mariana Alcoforado - Terceira Carta.

Não sei o que sou, nem o que faço, nem o que quero; estou despedaçada por mil sentimentos contrários. Pode imaginar-se estado mais deplorável? Amo-te de tal maneira que nem ouso sequer desejar que venhas a ser perturbado por igual arrebatamento. Matar-me-ia ou, se o não fizesse, morreria desesperada, se viesse a ter a certeza que nunca mais tinhas descanso, que tudo te era odioso, e a tua vida não era mais que perturbação, desespero e pranto. Se não consigo já suportar o meu próprio mal, como poderia ainda com o teu, a que sou mil vezes mais sensível? Contudo, não me resolvo a desejar que não penses em mim; e confesso ter ciúmes terríveis de tudo o que em França te dá gosto e alegria, e impressiona o teu coração [...] Enganei-te, és tu que deves queixar-te de mim. Ah, por que não te queixas? Vi-te partir, não tenho esperança de te ver regressar e, no entanto respiro. Atraiçoei-te; peço-te perdão. Mas não, não me perdoes! Trata-me com dureza. Que a violência dos meus sentimentos te não baste! [...] Mas agradeço-te, com toda a minha alma, o desespero que me causas, e odeio a tranqüilidade em que vivi antes de te conhecer.